sexta-feira, 6 de novembro de 2009

SER E VIDA (05 abril 2009)


- O que nós pensamos e dizemos ou escrevemos às vezes é realmente algo repleto de conteúdos, com significações surpreendentes.
Devemos reler certas coisas que são ditas de forma espontânea, mesmo quando inseridas num texto “teórico”.

O final da Introdução a “Dialética da Natureza”, escrita por F. ENGELS – o anjo Frederico - em 1875-76 e publicado em 1925... cuja 2ª. Edição de 1952, em Moscou, causou imensa surpresa - já que em 1923, outra referência à dialética da natureza havia provocado tamanha condenação (ao filósofo húngaro Gyorgy Lukács, chamado de idealista pelos espíritos mais pragmáticos – paradoxalmente...) é um desses textos que devemos sempre reler, porque ali vamos encontrar, como diria o próprio Engels, a ponta do fio de Ariadne. Vamos ler:

(...) temos a certeza de que a matéria será eternamente a mesma em todas as suas transformações, de que nenhum de seus atributos pode jamais perder-se e que por isso com a mesma necessidade férrea com que há de exterminar na Terra sua criação superior, a mente pensante, há de voltar a criá-la em algum outro lugar.

_ Bom, então podemos ficar seguros disso. Zoé !

Engels, meu Anjo querido, está nos dizendo que a matéria voltará a nos criar; mesmo que sejamos destruídos aqui na Terra, a matéria criará a Mente Pensante em outro lugar.
Engels já estava com a intuição e não sabia.
Vamos ver esse texto mais de perto :

A dialética da natureza consiste no fato de que a Natureza move-se num fluxo eterno e cíclico. (Tempo cíclico é o “tempo mítico” ou “sagrado”, aquele que sempre recomeça, retorna; e que se representa como um labirinto : quem entra sempre volta ao início – se tiver o fio de Ariadne ; encontra a luz no pátio central e faz o caminho de volta. Sempre recomeça, ampliando a consciência).
Durante o seu discurso, Engels menciona os avanços das ciências naturais até o seu tempo, inclusive ressalta a descoberta do paralelo entre a história do desenvolvimento do mundo orgânico em seu conjunto (vida coletiva ou zoé) e a história do desenvolvimento de cada organismo individual (biós). E é nesse momento que utiliza uma metáfora muito significativa : “ o Fio de Ariadne que devia indicar a saída do labirinto no qual a botânica e a zoologia pareciam cada vez mais perdidas”. O insight queria já se manifestar... foi por um triz.
O eterno retorno.
Engels, o Anjo ecologista (apesar de estrategista).

E ele continua sua dissertação “dialética”, que o ser humano, a “criação superior da matéria”, com sua mente pensante, nasce de uma diferenciação, não só como indivíduo (o mais complexo produzido pela natureza) mas também no sentido histórico.
Quando a mão humana se diferencia e o homem toma uma atitude ereta, assenta-se a base para o desenvolvimento da linguagem articulada e do cérebro – que nos distinguiram do macaco (ou do ancestral humano...).
Da especialização da mão nasce a ferramenta e a atitude especificamente humana: o trabalho criativo.
Só o homem modificou o Planeta, a Natureza, animais, plantas... “a tal ponto que os resultados de sua atividade só podem desaparecer com a EXTINÇÃO GERAL DO GLOBO TERRESTRE “. E isto foi conseguido valendo-se da mão... que foi sendo melhorada pela ação do próprio trabalho
_ Aqui Engels foi premonitório. –

Paralelo ao desenvolvimento da mão, foi-se desenvolvendo o cérebro e a consciência das condições necessárias para obter resultados úteis, depois da compreensão das leis da natureza e enfim desse conhecimento nasceram os meios de ação sobre ela.
Com o homem nasce a História. Não a história passiva dos animais, mas a nossa, que é feita de forma consciente, ativa. E o que nos tirou do estado animal e nos torna humanos: a produção dos meios de subsistência, a produção social _ ... e que precisa de um plano, de organização (urgente !)
Dessa organização da produção (e da circulação) nascerá a “nova época histórica em que os homens e suas atividades criativas, especialmente as ciências naturais, alcançarão êxitos em face dos quais será ECLIPSADO TUDO o que foi conseguido até agora “ - outro insight não manifestado; ele quis dizer que realmente tudo será eclipsado...
E segue o texto:
“Mas, tudo o que nasce deve morrer”: um dia o calor do sol começará a decrescer, o gelo dos polos já não poderá derreter (quem dera !), a humanidade, cada vez mais amontoada no Equador não encontrará nem aí o calor necessário para a vida. A vida orgânica desaparecerá e a Terra morta, esfera fria como a lua, girará nas trevas e cairá sobre o sol, também morto.
Mas, a matéria em seu eterno movimento achará um jeito de retornar ao início e o fogo se acenderá novamente, concentrando todo o calor perdido no espaço, e a nebuloza incandescente recomeçará a produzir luz... e se contraindo e se esfriando etc,etc,etc.
A matéria será eternamente a mesma em todas as suas transformações e há de recriar a mente pensante. (Mas, isto é “religioso”: a regeneração periódica do mundo, a renovação cósmica; algo mítico !).
Engels queria reafirmar a dialética materialista e derrotar o idealismo e a metafísica. Mas, o que ele não sabia – porque a sua querida ciência natural (quântica) ainda não havia descoberto, é que MATÉRIA É ENERGIA E CONSCIÊNCIA. Fato que já era, aliás, uma intuição muito antiga, dos Tantra. Essa dialética aí nem mesmo o Anjo chegou a sonhar. Contrários complementares: Vida sempre Bela (*).
Aqui está a verdadeira Dialética, Realista, a grande síntese; o materialismo foi apenas a primeira negação. O realismo é superação dialética. (“Material” se refere a uma relação social organizada pela produção).
Engels nos dizia que a Natureza e o Trabalho criam o homem. A ênfase no trabalho era uma necessidade histórica: despertar a consciência da classe trabalhadora. A ênfase na Natureza era ZOÉ.

O movimento cíclico, que é justamente o movimento do eterno retorno, o tempo MÍTICO ou sagrado, é uma dimensão, a esfera da Psique. E é nessa esfera que a matéria se reconstrói e sempre recriará a VIDA, dialeticamente, assim como os humanos se reconstroem pelo trabalho e como também assim, nessa dimensão mítica e sagrada, nós fazemos a nossa História. (Cronos é uma farsa...)

O que a linguagem encobre, a vida descobre.

A incompreensão do estágio mítico da existência humana, passagem necessária, no tempo e no espaço, ao desenvolvimento da consciência, é que condiciona equívocos e polêmicas, como a que obrigou o jovem Lukács a quarenta anos de autocrítica, depois de ter renegado o seu livro “História e Consciência de Classe”, condenado pela Inquisição paradoxal reformista social-democrata.

Pois é sempre com LUKÁCS que o Ontologia retorna.
--------

( * ) VIDA SEMPRE BELA é o título da música 202, de agosto de 2000; expressa a vida, que é energia e consciência; e a letra é do meu livro Lieberdade.


(Diário do Bardo - Joyce Pires)

Nenhum comentário: